O Comitê de Luta pela Legalização do Aborto/ Curitiba comunica que ESTÁ COM SUAS ATIVIDADES PARALISADAS desde o segundo semestre de 2009.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Aborto e saúde pública: 20 anos de pesquisas no Brasil

O relatório que saiu ano passado está disponível na Biblioteca Virtual do Ministério da Saúde:
Aqui em formato integral,
e aqui, resumido.

CORREIO BRAZILIENSE - DF [06.05.2008]
RETRANCA: OPINIÃO

Aborto: chance para a reflexão

José Gomes Temporão

O documento "Aborto e saúde pública: 20 anos de pesquisas no Brasil", produzido pela Universidade de Brasília e pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, financiado pelo Ministério da Saúde, expõe a realidade da prática de aborto no Brasil. O relatório revelou que 3,7 milhões de brasileiras já recorreram ao aborto e que mais de 70% delas tratam o procedimento como uma medida de planejamento reprodutivo, empregado em último caso, quando os outros métodos falharam.

Resultados que vão ao encontro de discussão que ocorre há mais de um ano e têm, em uma das pontas, a preocupação do Ministério da Saúde com o grave problema de saúde pública que é o aborto inseguro. Neste momento, com base científica, o Brasil tem a oportunidade de qualificar a discussão em torno da ampliação do âmbito de legalidade do aborto. O relatório produzido pelas pesquisadoras Debora Diniz, da UnB, e Marilena Cordeiro Dias Villela Corrêa, da Uerj, cumpre o papel importante de retirar o véu que encobre a realidade de morte e de graves seqüelas pelas quais são vítimas milhares de brasileiras, todos os anos.

A pesquisa revelou a subnotificação em torno dos casos, tendo em vista que chegam ao Sistema Único de Saúde mais de 220 mil mulheres por ano em razão de complicações da interrupção da gravidez, resultantes de abortos espontâneos ou intencionais. Dessa maneira, o texto revela dois Brasis: o de mulheres que podem pagar pela segurança na interrupção da gravidez; e o de mulheres que arriscam a vida e a fertilidade com procedimentos caseiros.

A verdade é que o aborto inseguro e a clandestinidade são fatores de morbidade e de mortalidade materna entre adolescentes e jovens, de todas as raças e etnias, atingindo, sobretudo, aquelas em situação de pobreza. Dados do Ministério da Saúde apontam a alarmente situação de um total de 2 mil mulheres que morrem anualmente de óbito materno no Brasil, quase 1.200 na faixa etária entre 10 e 29 anos.

Não fosse crime no Brasil, médicos e hospitais poderiam atender adequadamente as mulheres que se utilizam desse subterfúgio da interrupção da gravidez. A situação atual as deixa sujeitas a métodos cruéis que, quando não matam, deixam seqüelas irreversíveis, como a infertilidade. A pesquisa é importante ponto de reflexão sobre o tema. O Estado e sociedade devem refletir sobre esse debate, afinal o aborto é a quarta causa de mortalidade materna embora passe como se não existisse.

Na prevenção dessas mortes evitáveis e gestações indesejadas, o Estado brasileiro, por meio do SUS e de ações intersetoriais, coloca em prática políticas públicas que garantam os direitos reprodutivos a mulheres, adolescentes e jovens de ambos os sexos. A eficácia dessas políticas depende da disseminação de informações, que deve ser feita em casa e nas escolas e integrar as ações das equipes do Programa Saúde da Família.

Os ministérios da Saúde e da Educação, por meio do projeto Saúde e Prevenção nas Escolas, lançado em 2003, trabalham a inclusão, na educação de jovens das escolas públicas, dos temas saúde reprodutiva e sexual tendo como principais elementos a educação preventiva e formação de consciência crítica de forma interdisciplinar.

O objetivo é reduzir a vulnerabilidade dos jovens e adolescentes às doenças sexualmente transmissíveis, à infecção pelo HIV e à gravidez precoce, como resposta a estudos que mostram a exposição da população com idade entre 13 e 19 anos a todos esses eventos. O país não deve fechar os olhos para a ferida aberta que o aborto causa na saúde pública apenas porque o tema suscita debates entusiasmados.


*Mestre em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz e doutor em medicina social pelo Instituto de Medicina Social da Uerj, é ministro da Saúde.

Fonte: Correio Braziliense